quarta-feira, 6 de setembro de 2023

REFLEXÃO SOBRE A AMIZADE - texto Dom Samuel

 REFLEXÃO SOBRE A AMIZADE

Quão difícil foi, é, e possivelmente continuará sendo, encontrar na sociedade atual, confusa e desorientada, amigos verdadeiros aos quais possamos recorrer e com os quais será sempre possível contar irrestritamente sejam quais forem as vicissitudes dolorosas porque estejamos passando.

Não é necessário de modo algum apresentar provas, mesmo porque trata-se de um fato que ninguém ignora, que é muito difícil para qualquer pessoa ter ao seu lado neste efêmero jornadear aqui na terra outros seres(exceção feita aos mais próximos, quando isso ocorre) seres que verdadeiramente se preocupem conosco e que, tanto quanto pela sua própria, se interessam pela nossa felicidade e bem estar geral.

O apóstolo Paulo escreveu em uma de suas cartas: “Alegrai-vos com os que estão na alegria e chorai com os que estão na tristeza.” Que haja pessoas que aparentemente se alegrem conosco quando as coisas nos correm a contento e a medida de nossos desejos, nenhuma novidade há nisso nem é para se estranhar que assim o seja. Enquanto houver comida abundante em nossa mesa, não faltarão comensais sorridentes. Vindo, porém, a faltar, aqueles desaparecerão imediatamente como névoa matutina que se dissipa aos raios do sol.

Eis o que nos ensina a grande mestra que atende pelo nome de experiência! Quanto a chorar com aqueles que choram e lamentar o infortúnio alheio como se fosse nosso e também a nós nos atingisse, é algo bem difícil de se encontrar hoje em dia.

E se observarmos bem, notaremos que aqueles que navegam no mar da alegria – se verdadeira ou falsa só Deus o sabe! – nunca estão sozinhos, enquanto que os aprisionados no calabouço da negra tristeza via de regra lá estão solitários, chorando sem ter perto de si uma única pessoa que lhes enxugue as lágrimas e alivie com o bálsamo de uma palavra amiga ou de um gesto caridoso a dor que sentem.

Ensina-nos a santa Bíblia que amigo verdadeiro é uma dádiva liberalizada aos bons, pois de acordo com o velho Cícero, só há amizade entre pessoas boas, não havendo entre os maus mais do que cumplicidade. Os maus só tem comparsas!

A amizade costuma ser o resultado inevitável das notáveis semelhanças existentes entre nós e outra pessoa, a quem muito nos assemelhamos sob certos aspectos e que por sua vez, bastante se assemelha a nós. Inútil pois procurar ser amigo de quem é

o teu extremo oposto em relação a quase tudo! Semelhanças tendem por natureza a unir enquanto que as diferenças, sobretudo se são muito grandes, cavam entre duas individualidades abismos tais que não podem ser transpostos de modo algum.

Habituamo-nos a chamar de amigo alguém com quem conversamos vez por outra; uma pessoa com a qual almoçamos ou jantamos uma vez a cada ano ou quem sabe ainda um velho conhecido a cuja residência comparecemos em raríssimas ocasiões. Não digo eu que tais pessoas não sejam de fato e de verdade merecedores do nobilíssimo título de “amigo”, mas se as puséssemos à prova, de acordo com a excelente recomendação bíblica: “Se queres adquirir um amigo, adquire-o provando-o”, descobriríamos um tanto decepcionados que não tínhamos exatamente um amigo, como ingenuamente supunhamos, mas tão somente interlocutores esporádicos.

Muitas vezes certas pessoas descobrem um pouco tarde que o dinheiro que possuem, a casa em que moram, o cargo que ocupam no teatro social tem mais amigos que elas mesmas, sem pensar porém, que se o dinheiro criar asas e voar, se o cargo se escoar pelo ralo e se a casa desabar, vítima de algum tsunami súbito, a debandada vai ser geral!

Feliz porém aquele(a) que nada tendo a oferecer a não ser a si mesmo, ainda assim encontra amigos verdadeiros, de cuja amizade sincera e verdadeira pode ter certeza, já que cimentada única e exclusivamente naquilo que eu sou para o outro e este é para mim.

colaborador : Dom Samuel Dantas, OSB

Dom Samuel(Émerson Dantas de Araújo), é natural de Mauriti- Ce. Monge professo solene de votos perpétuos do Mosteiro de São Bento da Bahia, Salvador. É licenciado em Filosofia e Bacharelado em Teologia pela antiga faculdade de São Bento da Bahia e mestre em Filosofia pela UFBA(universidade Federal da Bahia)



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